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1. As relações econômicas e políticas entre União Européia e América Latina


1.1 A cronologia dos acordos e convênios políticos e econômicos

Há 25 anos a Comissão Econômica Européia iniciou um processo de expansão e aprofundamento de relações com suas ex-colônias da África, Caribe e Pacifico (ACP), firmando em 1975 diversos acordos consubstanciados no primeiro dos Convênios de Lomé. Em 1979 foi assinado o segundo acordo e em 1995 o quarto. Em setembro de 1998 teve início a negociação do Convênio Lomé V.

Nesse contexto ocorreram as primeiras aproximações com a América Latina, primeiro com os países do Caribe, através do Convênio de Lomé, e depois com a América Central através do "Dialogo de San Jose" que se iniciou em 1984 e tornou-se o mais antigo dialogo entre a Europa e uma agrupação regional americana. Em março de 1996 realizava-se o chamado San Jose XII , atualizando o intercâmbio .

Em dezembro de 1995 as diretrizes do Conselho Europeu de Madrid recomendaram o aprofundamento do diálogo com a região e apontaram como objetivos: apoiar a democracia, progredir rumo a liberalização do comercio, apoiar os processos de integração regional e direcionar melhor a cooperação. Cabe notar que com essas iniciativas a UE introduziu uma temática inédita no dialogo intercontinental : as questões da democracia e dos direitos humanos e a cooperação. Mesmo que na maioria das vezes apenas retóricas, as diretrizes estabelecidas, como veremos, prevêem enfoques diferenciados segundo as diversas sub-regiões e países latino-americanos,

Também nesse ano de 1995 foi assinado o Acordo Marco Interregional de Cooperação" entre a Comunidade Européia e o Mercosul, em continuidade do Acordo de Cooperação Inter-institucional de 29 de maio de 1992, que além de estudos e diagnósticos visando futura liberalização comercial incluiu inúmeras áreas de cooperação em temas como infra-estrutura, energia, telecomunicações, relações inter-empresariais, meio ambiente, educação e formação profissional.

Em junho de 1996 a UE assinou um Acuerdo Marco de Cooperación com o Chile, prevendo também como objetivo final a associação econômica e política entre os países europeus e aquele pais. A primeira fase para a liberalização comercial. Em dezembro de 1997 foi assinado o Acuerdo de Asociación Económica, Concertación Politica y Cooperación com o México e em julho de 1998 estabeleceram-se negociações formais para a liberalização do comercio entre esse país e a UE .

Em junho de 1998 as tratativas foram com a Comunidade Andina de Nações-CAN, tendo como primeiro resultado uma declaração comum sobre o diálogo político.

Desde 1990, com a adoção da denominada "Declaração de Roma" , tem havido também um aprofundamento do dialogo político entre América Latina e a Comunidade Européia, sendo seu espaço mais importante as reuniões anuais

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entre os Ministros de Relações Exteriores da Comunidade Européia e o Grupo do Rio. Desde 1995 têm havido também reuniões anuais (previstas no Acordo de Cooperação) entre os Ministros de Relações Exteriores da U E, do Mercosul e Chile e Bolívia na qualidade de países associados a esse bloco.

A nível interparlamentar realizam-se, desde 1974, Conferencias entre o Parlamento Europeu (PE) e o Parlamento Latino-americano (Parlatino), reuniões entre instituições desiguais e com pouco alcance prático.

No plano social e privado foi onde menos se avançou até o momento. Depois de algumas reuniões empresariais, em fevereiro de 1999 realizou-se no Rio de Janeiro o primeiro encontro inter-empresarial da UE e Mercosul, dando assim cumprimento a um âmbito previsto no Acordo de Cooperação Inter-regional, qual seja a formação de um Comitê Inter-Empresarial. Afora isso, por iniciativa própria, o Conselho Econômico e Social -CES tem realizado encontros com seus parceiros do Caricon e Sica, da CAN e com o Fóro Consultivo Econômico-Social -FCES do Mercosul constituiu um Comitê de Seguimento que tem como objetivos de curto prazo transformar-se num Comitê Misto inserido oficialmente no Acordo entre UE e Mercosul.


1.2 Relações Comerciais

Em 1996 a União Européia (UE) representava 6,5% da população mundial, detinha mais de um quarto do PBI mundial (28.6%) e foi responsável por 38,1% do comercio mundial de bens e serviços, incluindo o comercio intra-regional, e por 46,2% dos fluxos de Investimentos Externos Diretos- IED.

O objetivo fundamental da UE no diálogo de cooperação estabelecido com a América Latina tem sido a expansão e o fortalecimento das relações comerciais e econômicas visando fortalecer-se frente aos seus principais competidores, quais sejam os Estados Unidos e o bloco asiático. E pode-se dizer que tem sido bem sucedida a iniciativa. A pressão dos organismos multilaterais e dos países centrais para que os países em desenvolvimento e mais pobres adotassem modelos de economia aberta e desregulada, seguindo assim as diretrizes do chamado "Consenso de Washington" trouxe grande impulso a esse objetivo fundamental: entre 1990 e 1996 as importações da América Latina à Comunidade Européia aumentaram em mais de 120%, transformando o continente no seu mais importante parceiro no mundo subdesenvolvido. Ao mesmo tempo, as exportações da América Latina para o continente europeu subiram apenas em 18,8% pois, apesar do bloco europeu apresentar um quadro tarifário relativamente baixo, são muitas as barreiras que ainda se interpõem ao comércio intercontinental, notadamente nos produtos agrícolas e semimanufaturados, áreas prioritárias para os países latino-americanos.

Apesar que em 1996 a UE tinha uma tarifa externa média de 9,5%, para os produtos agrícolas a média de proteção tarifária estava ao redor de 25,4% o que somado a algumas barreiras elevavam as taxas para alguns produtos (carnes e lácteos, cereais, bananas, alguns tipos de sucos de frutas e vegetais) a mais de

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100% [ ALADI, " Las Negociaciones de la Unión Europea y sus Relaciones Comerciales con la Aladi ", ALADI/SEC/dt 404 9 de setiembre de 1998, http://www.aladi.com] . Até meados dos anos 90 as exportações latino-americanas entravam na Europa sob condições preferenciais, a chamada "clausula da nação mais favorecida" do Sistema de Preferencias Gerais (SPG). Depois da realização dos acordos de 4a. geração com o Mercosul (1995), Chile (1996) e México (1997) os europeus estabeleceram um novo SGP com maiores restrições a esses países, contrariando assim as próprias expectativas da liberalização de comércio prognosticada pelos acordos. em andamento. Por outro lado, duas sub-regiões, a Comunidade Andina e a América Central, receberam incentivos especiais dentro do novo SGP no contexto do programa de apoio à erradicação e substituição do cultivo de drogas ilícitas. Em grande parte esse grau de protecionismo explica o déficit comercial crescente e o baixo crescimento das exportações latino-americanas. E esse problema persistirá por algum tempo, já que até 2001 se prevê uma redução de 36% na média de proteção tarifária agrícola, com uma redução mínima por linha tarifária de 15%, ao passo que em relação ao setor industrial a mesma UE assumiu compromissos de, até o ano 2000, reduzir em 38% a tarifa média, incluindo a eliminação de tarifas de alguns produtos específicos.

Além disso as importações realizadas pela União Européia desde a ALADI através do Sistema Generalizado de Preferências representavam apenas 22.3% do total de importações no ano de 1996, porcentagem que se manteve estável desde 1992, tendo se registrado um pequeno salto apenas em 1995, quando se implementou o novo esquema SGP para o setor industrial, incluindo os produtos têxteis. Cerca de 50% das importações européias em nosso continente estão fora do SGP e cerca de 1/3 das compras compreendem uma tarifa integral.

quadro 1

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Dentre as exportações da América Latina para a Europa destacam-se o setor de alimentos, bebidas e tabaco ( 41% das vendas destinadas a UE no período 1990 – 1996) vindo a seguir algumas manufaturas, 24% do total, minerais e metais e outras matérias primas de origem agrícola (este último representa 5%).

Do ponto de vista das importações latino-americanas de origem na UE os manufaturados representam a maior parte: com participações que variam de 80% no México a 92% no Chile. Os primeiros produtos são do complexo automobilístico (que representam junto com máquinas 62,3% do volume exportado e 7% do total, sendo que os automóveis de passageiros tiveram uma taxa de crescimento de exportações no período de 54,8%)

Os países latinos têm uma pauta exportadora reduzida e muito concentrada em produtos primários (agrícolas e de extração mineral) e manufaturas de médio e baixo valor agregado, uma pauta com pouca diversificação - 15 produtos representam 51% do total e apenas 5 deles (pasta de soja, petróleo cru, cobre refinado, café e soja) cobrem de 32%. . Enquanto que o principal da cesta de produtos exportados pela UE à América Latina está composta por 73 produtos, quase 5 vezes o principal das exportações latino-americanas, e com um grau muito maior de diversificação.

A manutenção do protecionismo europeu tem sido uma preocupação também para vários dos países que integram a comunidade, já que tem sido apontado como um fator impeditivo do crescimento do comércio com a América Latina, perdendo espaço para os EUA e Japão que têm aumentado suas relações comerciais com essa região num ritmo maior que Europa, diminuindo a participação relativa desta no total do comercio. Em termos absolutos o comércio cresceu 75%, mas em termos relativos tem caído. Essa discussão será provavelmente o tema dominante na reunião de cúpula do Rio de Janeiro, apesar da impossibilidade de se avançar nesse terreno a curto prazo.


1.3. Os programas de cooperação econômica

Com a drástica redução da ajuda e da cooperação econômica dos Estados Unidos para a América Latina, a conseqüência mais visível do fim da guerra fria, a Europa tornou-se o principal provedor de ajuda governamental para a região. Assim entre 1992 e 1996 provieram da U E mais da metade (56%) dos recursos investidos na América Latina.

Essa ajuda tem se dividido entre: assistência financeira e técnica dirigida aos países mais pobres (70% para América Central e região andina ) e representando a metade do total da ajuda; ajuda humanitária, 1/3 do total e que no período de 91-96 foi destinada em sua grande maioria (80%) para os países centro-americanos, Cuba e área andina; e a cooperação econômica, que teve como principais beneficiários México, Brasil, Argentina e Chile, representando 17% do total.

Em termos puramente geográficos e a nível individual , Nicarágua, Bolívia, Peru e México são os países prioritários recebendo cerca de 45% do total da ajuda, no período de 1991-96.

Para o período para o período de 1996-2000 a cooperação européia foi definida segundo três eixos" prioritários:

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  • apoio institucional e à consolidação dos processos democráticos;

  • luta contra a pobreza e a exclusão social, e

  • apoio às reformas econômicas e à competitividade internacional.

Esses três eixos são percorridos "transversalmente" por três temas prioritários:

  • apoio à cooperação e integração regionais;

  • educação e formação ;

  • gestão da interdependência Norte/Sul .

O destino dos programas de cooperação é diferenciado conforme os níveis de desenvolvimento dos países latino-americanos, classificação feita de acordo com o montante do PIB. Os receptores principais da ajuda ao desenvolvimento são América Central, Caribe e a Área Andina, enquanto que o Mercosul, Chile e México se beneficiam primordialmente da cooperação econômica e comercial. Esta ajuda é canalizada, em sua maioria, através dos programas ECIP (European Community Investment Partners) e AL-INVEST e permanece fundamentalmente nas mãos de empresários das duas regiões

Em termos de tendências futuras prevê-se uma diminuição dos programas e sua centralização num pequeno numero de áreas, provavelmente educação e formação, cooperação econômica e meio ambiente. Prevê-se a utilização maior de programas globais com a duração plurianual, ao invés de projetos individuais, com o crescente uso de co-financiamento por parte dos organismos locais. Espera-se que haja uma maior participação da sociedade civil nos programas, o que hoje não acontece.

Neste apanhado geral dos programas de cooperação da Comunidade Européia, cabe mostrar que a heterogeneidade da América Latina é mais aparente do que real e portanto, os indicadores para definir os países que mais necessitam de cooperação deveriam ser mais diversificados, bem como prever-se a possibilidade de cooperação e apoio a regiões específicas dos países. Ainda que os Produtos Brutos Nacionais sejam muito diferentes, os problemas sociais são um denominador comum nos países e regiões do continente latino-americano. E os países com maior grau de desenvolvimento, como o Brasil, México e Argentina, têm internamente uma enorme disparidade regional A distribuição desigual da terra; o desemprego crescente e a falta de previdência e assistência social; a precariedade do trabalho; a discriminação da mulher e o trabalho infantil ; a falta de respeito aos direitos básicos do trabalhador e aos direitos indígenas, o deficiente auxilio à saúde; a péssima educação e o crescimento da violência urbana - são problemas comuns a todos. O nordeste brasileiro tem áreas tão ou mais pobre que a Nicarágua.

Cabe notar que a crescente pobreza de América Latina, às voltas com uma crise econômica sem precedentes, completando já "duas décadas perdidas" e altamente vulnerável a especulação financeira internacional, tem trazido enormes ganhos para os bancos e empresas dos países dominantes, e portanto, para os bancos e países europeus. Portanto é de se esperar que haja uma preocupação com medidas compensatórias para nossos países que possam

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minimizar a crise que vivem. Mesmo assim, parte significativa dos montantes destinados aos programas de cooperação permanecem no seio da própria União Européia, haja vista por exemplo os programas de cooperação com o Mercosul, onde cerca de 50% destina-se a cobrir gastos com consultorias e estruturas de apoio europeus.


1.4. A Cúpula de Chefes de Estado da União Européia, América Latina e Caribe

A Cúpula de Chefes de Estado terá uma agenda de efeito mais político que econômico, pois de um lado a participação da UE estará condicionada pelos seguintes fatores, entre outros:

  • a intenção de fortalecer a Política Exterior e de Segurança Comuns (PESC) estabelecida pelas reformas do Tratado de Amsterdã e amplamente testada em função da guerra na Iugoslávia;

  • a realização das reformas políticas incluindo a ponderação dos votos dos países membros na Comissão;

  • a entrada em vigor, com o lançamento do euro em 11 dos 15 países que a compõem, da terceira fase da União Econômica e Monetária (UEM);

  • a ampliação da União para a Europa Central e Oriental

  • a não aprovação do Mandado de Negociação e a falta de acordo sobre a nova PAC (Política Agrícola Comum) que terá um peso decisivo na redução e/ou eliminação dos subsídios, fator fundamental para a negociação com o continente latino-americano e caribenho.

E de outro lado, a América Latina enfrenta uma crise de instabilidade agravada pela desvalorização cambial brasileira e sob a pressão norte-americana para a realização da ALCA no menor prazo possível, sendo que entre 190 e 1996 esse país apresentou uma taxa de crescimento anual das exportações para esse continente de 11% e há pelo menos 4 anos têm uma relação comercial superavitária com a Argentina e Brasil. No caso brasileiro, desde 1994 as exportações para os EUA cresceram 22% enquanto nossas importações de lá, no mesmo período, cresceram 220% .

Mesmo assim o evento reveste-se de grande importância e deverá servir ao movimento social como um espaço de apresentação de propostas e demandas, dentre elas a participação direta da sociedade como consultora do processo de negociação.

A agenda da reunião define como pontos principais os seguintes:

  • Reforçar o dialogo político com o objetivo de reafirmar os valores comuns e fazer frente às exigências do próximo século.

Quanto ao dialogo político, os temas centrais da reunião de cúpula serão a consolidação da democracia; a promoção dos direitos humanos; o fortalecimento das instituições multilaterais; as medidas de apoio à segurança e

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de reforço da confiança; o desenvolvimento sustentável; a integração regional; a luta contra as drogas, o crime organizado, o terrorismo e o trafico de armas.

Segundo os organizadores da reunião o objetivo do dialogo e da cooperação neste âmbito será construção de uma comunidade mundial mais equilibrada, pacifica e cooperativa.

  • Maior dinamismo às relações econômicas e comerciais

Dar um novo impulso ao desenvolvimento e à diversificação do comercio, tendo em conta as negociações multilaterais e bilaterais em andamento para a liberalização comercial . Outro objetivo no âmbito econômico será a promoção de condições favoráveis às inversões e à diversificação do comercio, incluindo o fortalecimento do sistema multilateral de comercio.

Existe, também, o propósito de estabelecer uma troca de pontos de vista sobre os assuntos de interesse comum com relação à situação econômica e financeira internacional, com o objetivo de promover a estabilidade como pré condição para o crescimento econômico global.

  • Cooperação social e cultural

Estabelecer as bases de uma associação dinâmica e com perspectivas de futuro nos campos cultural, educativo e humano. Neste sentido se prestará especial atenção aos temas relacionados com a promoção dos direitos das mulheres e a igualdade entre os sexos em todas as esferas.


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